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quinta-feira, 24 de julho de 2014

A Copa 2014 e a eliminação do Brasil pelo olhar de Dunga

Ser eliminado de uma Copa do Mundo da FIFA nunca é um processo tranquilo para o Brasil, onde parece não existir a possibilidade de um trabalho ser considerado bom se não culminar com título.

Fonte: FIFA.com

Que o diga Dunga, que escutou uma enxurrada de críticas a tudo – inclusive seus quatro anos de resultados positivos - ao deixar o cargo de técnico da Seleção Brasileira com a eliminação para a Holanda nas quartas de final da África do Sul 2010.

É interessante, então, ver como, quatro anos depois, o treinador enxerga a acachapante derrota brasileira para a Alemanha na semifinal do Brasil 2014. Comentarista de televisão durante o Mundial, Dunga ainda entra em detalhes sobre o futebol jogado nesta Copa, especificamente pelas finalistas Alemanha e Argentina. Veja só o longo e interessante papo que o FIFA.com bateu com ele:

Como treinador e, agora como torcedor também, como você viu aquele apagão da Seleção Brasileira no primeiro tempo contra a Alemanha?
Acho que a Alemanha fez o que o Brasil fazia há muito tempo: montou um triângulo num lado do campo e depois passou a mudar o jogo, com passes de 40, 50 metros. E a vantagem é que ela tinha o jogador ideal do lado oposto, que era o (Thomas) Müller, com velocidade e qualidade para dar sequência. É até delicado falar que eles não fizeram nada de anormal ou de excepcional. Mas eles fizeram, sim, porque isso é simplesmente o que todo time sonha em fazer. A Alemanha jogou em bloco, teve aproximação, profundidade, velocidade e soube se defender nos momentos certos. Ao mesmo tempo, se a gente reparar nos gols, os brasileiros estavam sempre em superioridade de marcação - mas a quatro ou cinco metros de distância. E, hoje em dia, quando é preciso jogar de forma bem compacta, dar esse espaço pode ser fatal.

Falavam que a Alemanha não havia encantado na Copa, aí veio o jogo com o Brasil. Para você, o que aconteceu para que eles enfim se soltassem e jogassem o futebol que todos esperavam?
O fato é que a Alemanha montou seu quebra-cabeça durante a Copa e acertou o time depois daquela vitória contra a Argélia, na qual tiveram muitas dificuldades. Ele (o técnico Joachim Löw) tirou o (Philipp) Lahm do meio e o pôs na lateral, onde é excepcional. Colocou o (Sami) Khedira no meio com o (Bastian) Schweinsteiger, pôs um jogador mais rápido na defesa, que é o (Mats) Hummels, e o (Miroslav) Klose na frente. No meio, o Schweinsteiger comanda o time tanto na hora de marcar como de pressionar e dar ritmo ao jogo. Ele sabe a hora de recuar e ficar no meio dos dois zagueiros, de subir ou pressionar. As pessoas têm que entender que uma seleção não é montada só com os melhores jogadores, mas, sim, com aqueles que se encaixam nas características de que você precisa. O futebol se equiparou muito. O problema é que, no Brasil, a gente acha que, se um jogador é excepcional, ele não precisa ter função tática. É essa mentalidade que precisa mudar.

Acredita que a Copa das Confederações ajudou a aumentar a pressão nos jogadores ou a fazer com que acreditassem que o time estava pronto para ganhar uma Copa do Mundo?
Não tanto. Independentemente da competição, o Brasil sempre é um dos favoritos, e o jogador precisa saber viver com essa pressão. Temos jogadores nos melhores times do mundo – Real Madrid, Barcelona, Chelsea –, que estão acostumados a ganhar. Acho que a Copa das Confederações deu, sim, mais confiança a eles. E foi bom passar por isso, para encerrar aquele receio sobre a Copa do Mundo. No fim, o torcedor abraçou a Seleção Brasileira, apoiou em todos os jogos, até mesmo neste contra a Alemanha. Eu tive experiências contrárias, como em um jogo de eliminatórias contra a Argentina, em Minas, no qual fomos vaiados durante 90 minutos. Desta vez não houve isso.

O problema é que, no Brasil, a gente acha que, se um jogador é excepcional, ele não precisa ter função tática. É essa mentalidade que precisa mudar.

Dunga, técnico da Seleção na Copa de 2010

Após a derrota de 2010 houve o início de um novo ciclo na Seleção. Agora, provavelmente, vai acontecer o mesmo. Quais lições você acha que podem ser tiradas dessa experiência atual?
Bom, isso é algo para quem está lá dentro. Agora, qualquer seleção que venha a uma Copa do Mundo tem que ter uma programação, e suas decisões têm que ser respeitadas. Eu fui muito criticado por deixar os jogadores mais concentrados, mas é difícil para os outros entenderem que, com o espaço de tempo sendo curto, você precisa aproveitar tudo da melhor maneira possível. Para uma seleção, Copa é trabalho. Para quem está ao redor, é uma festa. Então, tem que saber dividir bem, porque a cobrança será alta. Haverá discussões, mas, não é porque perdemos que se pode dizer que tudo está errado. Há muitas coisas boas que precisam ser aproveitadas.

A Holanda mesmo, que ganhou do Brasil em 2010, manteve uma base experiente e conseguiu essa continuidade. A Alemanha também. Acha que faltaram elos com a geração antiga do Brasil, principalmente no que diz respeito à experiência?
Como disse, não é porque se perde que tudo está errado. E também não é porque um jogador está com idade mais avançada que ele não pode mais atuar. O Klose, por exemplo, tem 36 anos e é o maior goleador da história das Copas. Ou seja, é preciso ver a média de tudo e encontrar um equilíbrio, com renovação e jogadores experientes que, na hora da dificuldade, possam chamar a responsabilidade, possam ser líderes em campo e unir a equipe para evitar essas panes como a que aconteceu com a Seleção.

Olhando então para a Seleção, você acha que será preciso uma outra renovação? Ou muitos jogadores têm perfil para continuar e liderar a nova geração para 2018?
Vai depender da continuidade e do rendimento que alguns destes jogadores terão. Eles precisam entender que vai haver a crítica e que isso é preciso ser superado. Porque as gerações se criam durante os momentos de dificuldades. Como uma Copa é uma competição curta, sem tempo de recuperação, estes jogadores precisam ser maduros, assimilar o golpe e reagir. Se isso acontecer, acredito que muitos deles tenham tudo para permanecer.

Você falou muito bem da Alemanha. Como vê a Argentina para esta final? Taticamente, ela parece pronta para buscar o título?
Acho que a situação é parecida: a Argentina foi montando seu quebra-cabeça ao longo da Copa e fez mudanças de jogadores que deram certo. Por exemplo, o (Javier) Mascherano ficava muito sozinho no meio de campo antes. Então, com a entrada de um jogador que se posicionava com ele, o setor ficou mais forte. O (Martín) Demichelis deu mais personalidade, e as peças se encaixaram. E isso modificou um pouco o posicionamento do (Ezequiel) Lavezzi, também, que passou a retornar um pouco. Ofensivamente, eles já têm (Lionel) Messi, (Gonzalo) Higuaín e o próprio Lavezzi; não precisa de muito mais. É preciso ter espaço para chegar com velocidade, e não tumultuar tudo.

Usando isso como base, você acha que essa Copa traz uma nova tendência para o futebol de hoje, com uma maior busca de gols e times mais no ataque?
Veja, não é porque usamos três ou quatro jogadores na frente que teremos obrigatoriamente um time ofensivo. Podemos ter um ou nenhum jogador, e ainda chegar com quatro ou cinco no ataque. São paradigmas que estão sendo quebrados durante a Copa. A única seleção que jogava com três à frente e pressionava o tempo todo era o Chile, mas isso pelas características de seus jogadores. Eles sabiam que, defensivamente, não tinham estrutura física para suportar o choque, então reagiam atacando. No geral, acho que a tendência é ter mais jogadores ofensivos e rápidos, que jogam no erro do adversário. Saíram muitos gols na Copa porque os atacantes estão cada vez mais eficientes e móveis em campo. E nesse sistema de hoje, com todo mundo marcando junto, voltando atrás do meio de campo para fechar os espaços e atrair o adversário – e, aí, sair com velocidade após a recuperação –, traz bons resultados. O jogo em geral fica mais dinâmico.


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